sexta-feira, 17 de agosto de 2012

“Os pássaros quando morrem caem no céu.” (José Gomes Ferreira)


Há 50 anos, na Lombada da Ponta do Sol, um grupo de gente anónima empenhava-se, com determinação e coragem, numa luta justa pelo direito à água. Durante longas semanas, o povo uniu-se e enfrentou a máquina poderosa e violenta da ditadura fascista de Salazar, resistindo ao terror que os seus esbirros semearam. Com dignidade afirmaram a justiça da sua causa enfrentando as duras humilhações ditadas pelo poder.
Serve esta evocação da nossa História, para agitar estes tempos de conformismo e desalento em que somos vencidos pelo medo, esse inimigo mais forte e pelas nossas próprias indecisões, o maior obstáculo como dizia Cervantes. Vamos sofrendo perante o alastramento de uma pobreza que dá milhões a ganhar a uns poucos poderosos, vamos ganhando uma raiva surda perante a imoralidade das injustiças impostas pelo poder e vamos chorando os que tombam por lhes ver negada a dignidade. Estes absurdos vão criando a solidariedade, por isso, só nos falta a convicção da nossa causa comum. Como há 50 anos na Lombada da Ponta do Sol, precisamos de acreditar na justiça da nossa razão. Temos ou não temos razão quando exigimos trabalho com dignidade e direitos? Quando queremos mais e melhor Educação e mais e melhor Saúde? Quando exigimos protecção e segurança social? Quando exigimos o fim das mordomias dos poderosos e uma repartição equitativa da riqueza gerada por todos? Sim, temos razão.
Aquele povo deixou-nos uma lição fundamental, a de que a certeza da justiça de uma causa derruba todos os obstáculos e derrota os piores inimigos, sobretudo, porque nos torna poderosos. A Revolta da Água em 1962 tornou-se no testemunho de que a justiça e a solidariedade mudam o mundo, devagarinho e às vezes com muito sofrimento como aconteceu então, mas mudam-no, irremediavelmente e sempre, para melhor.

Nota: Um obrigada especial ao blogue "Clarear" pela belíssima fotografia.

sábado, 4 de agosto de 2012

No melhor e no pior: as Fundações

O governo resolveu fazer de conta de que está surpreendido com o "negócio" das Fundações. Finalmente, apurou-se (mais ou menos!) o valor das contribuições do Estado para algumas instituições que todos sabíamos, há muito, servirem apenas como mais um instrumento de malabarismo fiscal. Quem é que, no domínio do seu perfeito discernimento, poderia acreditar nas causas filantrópicas de Fundações como a de Luís Figo, a de Joe Berardo  e a da Casa de Bragança?! Mas, mais uma vez, com a ajuda de alguns órgãos de comunicação social, tudo se mistura de forma deliberada para que se confundam causas justas e instituições credíveis com os "eternos" mecanismos de clientelismo, suborno, corrupção e oportunismo que a Revolução e a Democracia não conseguiram destruir por completo. O mesmo poder hipócrita, corrupto e imoral da ditadura continua a fazer escola e a manter-se por força da atávica apatia da maioria dos portugueses.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Pela dignidade do direito ao trabalho


Esta semana foi publicado o relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), “Crise do Emprego na Zona Euro: tendências e respostas políticas”, nele se reafirmam propostas para a resolução do gravíssimo problema que os países da zona euro atravessam e cuja tendência, se nada for feito para atalhar este caminho a que nos conduzem as opções neoliberais dos governos europeus compostos por marionetas da troika, nos levará a um futuro negro de milhões de excluídos pelo desemprego de longa duração, a uma percentagem catastrófica de 32% de desempregados em idade activa, à precarização/”escravização” do trabalho dos mais jovens, a salários de miséria e à completa perda de garantias de protecção social.
As propostas da OIT são concretas e perfeitamente exequíveis a curto prazo, insistem na resposta urgente de criação de emprego na convicção de que a redução de salários, o desemprego, a precariedade e a insegurança não são consequências da crise mas sim a sua “matéria-prima”.
O trabalho com direitos é o fundamento estruturante das sociedades democráticas sendo o seu primeiro lugar de socialização porque os valores recebidos da família e na escola orientam e preparam para a integração no mundo do trabalho. O trabalho com direitos convoca à participação cívica e política porque promove os valores da motivação, dignidade e responsabilização. O trabalho com direitos é o motor fundamental do crescimento económico porque o salário não é entendido como um custo mas como o alicerce da dinamização da economia e como o elemento estruturante de distribuição de riqueza.
Só seremos capazes de fazer frente a este retrocesso civilizacional se recuperarmos o valor fundamental da democracia que é o trabalho com direitos. Esta foi a extraordinária lição de cidadania que esta semana os mineiros espanhóis nos deram, por isso, sigamos-lhes os passos e lutemos pela dignidade do nosso direito ao trabalho.

domingo, 17 de junho de 2012

Hoje somos todos gregos


Hoje os cidadãos gregos, franceses e egípcios são convocados a eleições e escolherão pressionados entre a sua vontade de mudança e o terrorismo do discurso do poder sobre o caos. São chamados a dar voz a uma nova síntese que, no processo dialéctico que é a História, poderá representar uma nova alternativa ou, então, se continuarem a vencer os que já estão no poder, apenas o arrastar da actual conjuntura de crise até ao, muito previsível, colapso à escala global. Gregos, franceses e egípcios estão hoje entre o medo e a esperança, entre o imobilismo e a coragem, entre a resignação e a responsabilidade.
As semelhanças, infelizmente dramáticas, entre Portugal e a Grécia, devem fazer-nos espectatores atentos sobre o que está a acontecer naquele país. Lá como cá, ao longo dos anos de adesão à União Europeia, fomos recebendo fundos sob a capa das boas intenções para remediar o enorme atraso que tínhamos em relação ao resto da Europa mas o que esse caudal de dinheiro serviu, e todos o sabiam, foi para alimentar, despudoradamente, uma elite posta no poder pela questionável legitimidade democrática da abstenção. Lá como cá, os que se juntaram aos partidos que, rotativamente, estiveram e estão no poder, fizeram fortunas pessoais e dispuseram-se a cumprir as ordens das grandes empresas e da banca que não têm pátria nem moral e que por isso, se “dão nas tintas” para impostos e contributos para o crescimento económico (vivem e promovem zonas francas e paraísos fiscais). Lá como cá, todos sabiam que o sistema imporia um dia, a cobrança da dívida e lá como cá, todos sabiam que os únicos que a iriam pagar, seriam os que muito pouco ganharam. Lá como cá, a estratégia da União Europeia e os seus chefes (FMI e Banco Mundial) foi criar o monstro do buraco orçamental e do escândalo da dívida externa. Lá como cá, apareceram como “virgens ofendidas”, organizadas numa “troika” que suga a dignidade de cada português e de cada grego que vive do seu trabalho. Lá como cá, agem como terroristas que espalham o medo reprimindo pela fome e pelo sofrimento os que foram enganados tentando que não usem o seu direito inalienável de escolha de um novo rumo. Lá como cá, temos de convictamente unir forças para a mudança que tem de ser já hoje.

sábado, 9 de junho de 2012

À Camila

O JN de hoje dá conta de uma luta pela dignidade levada a cabo pelos pais da pequena Camila (aqui). Aqui fica o belíssimo poema que o pai, Carlos Sanchéz, escreveu em plena batalha pelo direito a dar à filha uma morte digna.


Camila não fala, mas diz.
Camila não olha, mas faz ver.
Camila não chora, mas faz correr lágrimas.
Camila não ri, mas valoriza a alegria.
Camila não pensa, mas ensina.
Camila não suspira, mas dá-nos alento.
Camila não ama, mas apaixona-nos.
Camila não se move, mas mobiliza.
Camila não mostra, mas nada oculta.
Camila não reclama, mas sabe resistir.
Camila não saboreia, mas é doce.
Camila não pisca, mas abre-nos os olhos.
Camila não ouve, mas escuta-nos.
Camila não trabalha, mas dignifica.
Camila não anda, mas abre caminhos.
Camila não decide, mas invoca decisões.
Camila não escreve, mas educa.
Camila não brinca, mas é uma menina.
Camila não agirá, mas comove.
Camila não cresce, mas dá corpo à esperança.
Camila não dorme, mas desperta-nos.
Camila não respira, mas purifica o ar.
Camila não ama, mas desarma corações.
Camila não condena, nas fará justiça.
Camila não come, mas alimenta almas.
Camila não grita, mas derrota a surdez.
Camila não recorda, mas tem futuro.
Camila não acusa, mas perdoa-os.
Camila não salta, mas derrubará icebergues.
Camila não procura, mas sempre nos encontra.
Camila não bebe, mas cala a sede.
Camila não reza, mas prega.
Camila não abraça, mas abrange-nos.
Camila não canta, mas é música.
Camila não cala, mas silencia.
Camila não pinta, mas tudo ilumina.
Camila não beija, mas aceita todos os beijos.
Camila não pode ser julgada, porque é um anjo.
E os anjos pertencem a Deus.

sábado, 2 de junho de 2012

Sintomas de uma cidadania gravemente doente

A entrevista publicada hoje no DN-Madeira do jovem deputado e ex-líder da JSD pode vir a tornar-se no melhor dos exemplos do que é a mais completa perversão dos valores da democracia e do exercício da cidadania. Podemos começar por dizer que há ali, pelo menos, uma enorme deformação educacional que resultará de vivências prematuras num ambiente pouco saudável mas, se isso já de si é grave do ponto de vista humano, é muitíssimo mais grave do ponto de vista do seu significado político e social porque aquele jovem integra um colectivo partidário, assumiu até há pouco a liderança de uma juventude partidária que recrutou e continua a recrutar, centenas de jovens madeirenses e vai continuar a desempenhar funções em nome daquilo que se designa na Constituição da República por "vontade popular", por isso, é muito grave quando ele se justifica em termos que têm por fundamento uma concepção de poder delegado por condição de nascimento ou por determinação "superior". Aquele deputado (provavelmente à semelhança dos que o "criaram" e rodeiam na sua bancada parlamentar) entende-se como uma criatura acima da lei, confessando julgar-se digno de uma impunidade própria dos imbecis ou dos psicopatas. É grave e inquietante.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

"Reflexaozinha"

Às vezes fico com a impressão que há assim uma espécie de dois grandes grupos em que podemos dividir os portugueses: os que esperam pelo D. Sebastião e os que se acham o D. Sebastião. Para esta "brilhante" reflexão acabo por só encontrar uma imagem para a ilustrar, a do cão neurótico que corre furiosamente atrás da sua própria cauda.

terça-feira, 8 de maio de 2012

Prós e Contras da RTP 1 - o meu modesto balanço

Não faço ideia quem são os "prós" e quem são os "contras" porque há sempre um problema de definição clara do que se está a discutir. Logo aqui se manifesta a fragilidade profissional da apresentadora/pseudo-jornalista que é responsável pela condução do programa. A senhora configura uma das associações mais dramáticas: falta de inteligência, arrogância e "lambebotismo" ao poder mas adiante...Perante o figurino do programa há uma coisa que sei: neste momento,de um lado está uma esquerda esclarecida e proponente representada por o líder PCP e deputado da AR e um professor universitário, do outro tem duas eminências pardas do PSD, daquela estirpe que  amiúde é chamadas à comunicação social para "vomitar" o pensamento único, ideologicamente neo-liberal, do regime instituído que com a legitimidade democrática de uma minoria que foi votar, serve os interesses das grandes empresas e do capital financeiro que, como todos sabemos, não tem pátria. Oiço propostas de solução bem concretas do lado de Avelãs Nunes e de Jerónimo de Sousa e ainda não consegui perceber, para além da receita da austeridade (que, de resto, os "preocupa" muito!) que soluções tem o PSD para combater o desemprego e fazer crescer a economia!  Agora a tirada patriótica de Rui Manchete, foi a cereja em cima do bolo: demagogia e hipocrisia eram perfeitamente dispensáveis!

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Alexandre Soares dos Santos: a imoralidade não tem limites!

Alexandre Soares dos Santos "oficializou" uma nova era: a do vale mesmo tudo! Não é que já não tenhamos assistido em actos, palavras e decisões da parte do poder e dos patrões, à completa ausência de respeito pela dignidade do trabalho e dos trabalhadores mas a notícia avançada, hoje, (AQUI) sobre a atribuição de 500% sobre o valor da retribuição diária, acrescida da oportunidade de comprar com 50% de desconto nos supermercados da rede, é uma canalhice que, de tão rasteira, deixa qualquer um que vive honestamente do seu trabalho, refém das circunstâncias. O patrão do Pingo Doce compra, assim, bem barato, o direito que devia ser inalienável numa sociedade justa, ao trabalho com dignidade e direitos. O que esteve em causa, ao contrário do que se tentou fazer crer, não foram quaisquer direitos dos consumidores ou dos fornecedores/produtores da cadeia mas sim, a pressão exercida sobre os trabalhadores para que não reivindicassem o direito consagrado na lei, ao feriado do 1º de Maio. Com esta estratégia torpe, Soares dos Santos consegue por trabalhadores contra trabalhadores, o que mais do que uma vitória do poder, é uma derrota dos valores básicos de uma sociedade democrática, os que fundamentam a dignidade de quem vive do rendimento do seu trabalho.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

"Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara." (Livro dos Conselhos)

Ontem, durante todo o dia e apesar de concentrados (ou talvez por isso mesmo) no dever de transformar o 1º de Maio num grande protesto contra o desemprego e o empobrecimento, fomos sendo surpreendidos pelas notícias, mais ou menos, chocantes sobre o estranho fenómeno desencadeado pela desonesta campanha da cadeia Pingo Doce. Sobre a imoralidade da estratégia comercial já muito foi dito, o oportunismo sem escrúpulos só veio confirmar aquilo que sabíamos acerca da empresa e dos seus gestores. A pronta intervenção das forças policiais e o silêncio dos responsáveis políticos mostraram os descaminhos da nossa Democracia.
Tudo o que de pior pode emergir no comportamento humano em tempo de tensão social e de dificuldades económicas, foi observado no grotesco dos quadros  das reportagens que nos foram chegando. Aqueles que aos olhos da empresa perderam há muito a condição de humanos e são agora classificados como consumidores dividiram-se em dois grupos que se comportaram à altura das expectativas dos arquitectos da campanha: de um lado a lascívia da ostentação consumista dos que ainda possuem dinheiro, do outro, os cálculos dolorosos de quem não  sabe já como aguentar o mês inteiro fintando a fome. A luta foi feroz e a selecção darwiniana acabou por valer aos mais adaptados. Houve relatos que recordaram passagens do "Ensaio sobre a Cegueira" de José Saramago. E ainda mais terrível é que se vão multiplicando as situações quotidianas que evocam as reflexões daquele romance magistral do nosso Nobel da Literatura: "Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem."

terça-feira, 1 de maio de 2012

"Pingo Doce: sabe bem enganar tão baixo!"


Alexandre Soares dos Santos já deu provas da sua falta de moral ao deslocar , em termos fiscais, a empresa a cujo conselho de administração preside para a Holanda num gesto de profundo "patriotismo", mas a estratégia que os supermercados Pingo Doce preparam para hoje, dia  1º de Maio, raia a pulhice mais nojenta que se pode imaginar porque troça dos seus trabalhadores e das dificuldades financeiras das famílias portuguesas. Oferecer 50% (AQUI) do total das compras superiores a 100 euros no dia em que está anunciada uma greve dos trabalhadores das grandes superfícies comerciais e em que decorre uma campanha, mais do que justa, contra as compras no dia feriado, é uma estratégia que só pode ser usada num país onde a  lei e a desregulação total das relações laborais servem apenas os patrões e as grandes empresas. É a mais pura canalhice num país em que o povo esmola e o governo serve os traidores à Pátria.

*(agradecimento ao blogue O Economista Português pela fotografia)

sexta-feira, 20 de abril de 2012

A arte de bem fazer favorzinhos ao regime e de desacreditar a Democracia.

É muito difícil fazer de conta de que os episódios lamentáveis que têm decorrido na Assembleia Legislativa Regional tendo por protagonistas o seu presidente e os deputados do PTP, me deixaram sem qualquer tipo de reacção que não seja a do desprezo. Mais do que desprezo profundo pelo sucedido e pelos seus miseráveis protagonistas (uns quantos sedentos do vedetismo barato de quem se faz de vítima em directo para as câmaras e o outro usando da hipocrisia dos que não têm coluna vertebral), sinto raiva e tristeza  pela forma como aquele órgão se tornou o instrumento mais eficaz do regime: durante trinta anos o PSD-M quis transformar aquela casa no lugar onde se desacredita a Democracia e a Autonomia, usou de linguagem chã e de caserna, insultou os adversários que mantiveram a sua integridade e manipulou os traidores que se venderam, sobretudo, usou e abusou do poder para fazer leis a seu favor e da chusma de oportunistas que o compõem e agora, já no estertor do regime, faz render a agonia alimentando um circo cuja única intenção é desesperar os que precisam de ver resolvidas, com urgência, a fome e a miséria que todos os dias crescem nas suas casas. Enquanto uns quantos bobos se dispuserem a fazer rir a corte, a voz daqueles que clamam por justiça e exigem contas aos que desmandam as nossas vidas, serão silenciadas. É isso que o PSD-M quer e o regime jardinista precisa para sobreviver.

terça-feira, 17 de abril de 2012

UM POVO FÁCIL DE GOVERNAR

Com um especial obrigada ao Luís Afonso pelo cartoon (Público, 17/04/12)
Oiço, em conversas informais, a afirmação da recusa em saber o que se passa e de ouvir o que quer que seja sobre a actual situação de crise que a Europa, o país e, em particular, a região, atravessam. Se compreendo a estratégia emocional de defesa, surpreende-me o tão rápido conformismo de cada um à condição de sujeito passivo da vontade de uma minoria no poder. Por mais que tentemos fugir dos factos, a dureza da realidade está aí e agravou-se ferozmente com a entrada em vigor do Programa de Ajustamento Financeiro da Madeira no dia 1 de Abril. É certo que este conjunto de imposições, para garantir a perpetuação da elite do regime, afecta mais uns do que outros mas também é certo, de que a todos deixa a dolorosa garantia de um futuro incerto e sombrio. Com a marca do “socialmente correcto” reforçou-se uma atávica resignação e um ensurdecedor silêncio que condenam, com espantosa veemência, a coragem para protestar e a capacidade para propor alternativas. Chego a ouvir às vítimas, os mesmos argumentos daqueles que as arrastaram, nos seus delírios de poder, até à sua desgraça.
Poucas coisas serão tão fáceis de fazer quanto governar um povo assim: tomam-se decisões criminosas para o presente e para o futuro, destrói-se deliberadamente, em proveito próprio, o que pode gerar riqueza para todos; hipoteca-se a democracia e a autonomia a troco de miséria para todos e poder para os mesmos. Dizem os manuais de Sociologia e de História que quanto mais instituída é uma crise, maior é a ausência de controlo sobre quem governa, por isso, estamos em tempos de escolhas: queremos continuar a preferir a falsa protecção dos servos debaixo da canga ou queremos exigir contas aos que tomaram e continuam a tomar as decisões contra os interesses de todos usando de demagogia e populismo para enganar os incautos e ignorantes e mudar o rumo dando voz e vez aos que recusam e propõem, com responsabilidade, outro caminho? 

sábado, 14 de abril de 2012

O Noticiário da TVI no seu melhor...

A TVI, mais uma vez, faz-se eco de posições das mais perigosas sem permitir o contraditório. A última peça do noticiário da tarde foi sobre a encomenda de assassínios e deu-se a palavra a pessoas das mais diversas origens. O que foi muito grave é que a título de conclusão, o último interveniente (um jurista qualquer cujo nome e ocupação não registei) afirmou categoricamente que o preço da vida baixou em virtude da multiculturalidade (?!), explicando que o encontro de culturas trouxe para o nosso seio, cidadãos de culturas em que a escala de valor da vida é muito baixa (?!). Disse este absurdo com o ar mais académico e científico do mundo e a peça terminou...Ora ainda que os imigrantes envolvidos nos casos relatados viessem de  "civilizações menos evoluídas" (juízo de valor que só é possível a quem sustenta a sua ignorância e estupidez na generalização abusiva, no preconceito), os mandantes foram sempre "bons" portugueses, dos de cepa e foi mesmo referido que num dos casos, uma cidadã reconhecida por todos como boa cristã católica com todos os "sacramentos em dia". Senhores jornalistas da TVI já que poupam na inteligência ao menos sejam mais pródigos no profissionalismo. E também gostaria muito ver o tal senhor jurista a ser emigrante na Alemanha onde gentinha como ele, mas alemã, considera que Portugal é uma cultura onde a escala de valor da vida é muito baixa e que, portanto, somos todos potenciais criminosos: "...é o preconceito, estúpido!"

quinta-feira, 12 de abril de 2012

"A pobreza na própria Pátria é um exílio." Provérbio Árabe

Hoje na aula veio a propósito falar em exílio, falámos sobre os sentimentos que devem experimentar os que se vêem obrigados a fugir da sua pátria e viver numa terra que, ainda que de acolhimento, não deixa de ser estranha no que de mais de profundo e consolador nos une à terra-mãe. A aula prosseguiu e no final houve, como sempre há,  lugar para as pequenas conversas que nascem daquela comunhão entre pessoas que partilham o mesmo quotidiano com a esperança de cumprir um objectivo que vindo de uma motivação e um trajecto individual, não deixa de ser também uma caminhada em conjunto. Os últimos meses têm trazido uma partilha dolorosa, aumenta o número dos atingidos pelo desemprego, desabafa-se sobre as dificuldades diárias cada vez maiores, exprime-se o sentimento de indignação mas também se reforçam a coragem e determinação em não perder a dignidade.A caminho de casa ocorreu-me um provérbio árabe que em tempos ouvi e me pareceu de uma profunda sabedoria " A pobreza na própria Pátria é um exílio." Estamos a ser exilados dentro da nossa própria pátria, condenados à condição de estrangeiros na terra que nos viu nascer e a que chamamos nossa. Uns quantos párias que tomaram o poder negam-nos a cidadania e a liberdade, estrangulando-nos na pobreza.

sábado, 7 de abril de 2012

Para depois da Páscoa...

Sete dias passaram sobre a entrada em vigor do Programa de Ajustamento Financeiro da Madeira. O silêncio mais absoluto tem marcado esta semana em que os madeirenses se têm confrontado com o aumento brutal do preço dos bens essenciais e com o agravamento de todo o tipo de dificuldades quotidianas (empresas que encerram; patrões que exploram; serviços públicos num caos; insegurança crescente). Aquele a quem a menor réstia de luz de projectores é sempre ocasião para as mais "profundas" bojardas remeteu-se ao silêncio mais ensurdecedor, nem o areal dourado do Porto Santo o parece "inspirar". O regresso das imerecidas férias da Páscoa, será marcado pelas atroadas do costume e para defesa pessoal aí vêm difamação, arrogância e prepotência. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos porque se a Madeira Nova já provou que era de madeira velha e podre corroída pela formiga branca, o deslumbre do poder já só funciona sob o efeito de sedativos à mistura com muito álcool.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

O eufemismo ao serviço do Poder

De manhã passei os olhos pelos jornais on-line e voltei a encarar com o cuidado que os funcionários do poder colocam na sua linguagem procurando relativizar a gravidade e a violência diárias que a maioria dos portugueses enfrentam. Em tempo de Páscoa, momento de celebração da Ressurreição com todo o significado que encerra de  vitória sobre a injustiça e a prepotência dos que querem dominar o mundo, a hierarquia católica "alerta" para a pobreza ( a palavra denúncia tem consequências perigosas, acorda consciências e provoca mal-estar); a UGT pela voz do seu inefável secretário-geral diz que a decisão do governo sobre as reformas "penaliza" os portugueses (a palavra violenta do verbo violentar, nunca seria usado porque violentaria os acordos estabelecidos entre a chamada central sindical, os patrões e o governo); o FMI afirma-se "triste" com o trágico suicídio de um reformado frente ao parlamento de Atenas em protesto contra o vil corte de pensões (o adjectivo eufórica, indignaria o cidadão comum e reforçaria o gesto, por isso, optam pelo "politicamente correcto" e dizem-se, hipocritamente, "profundamente tristes", pois então, é em geral, dos poucos consenso que a morte de um semelhante costuma gerar. Estes eufemismos servem para continuar a manter o estado de torpor de um povo que tarda em reagir e a reclamar dignidade.

"NÃO HÁ DRAMA, TUDO É INTRIGA E TRAMA" grafitti citado por José Gil

À hora do almoço, ouvi e vi mais uma daquelas reportagens televisivas dos noticiários nacionais em que algumas pessoas são entrevistadas. Desta vez perguntava-se como mantinham as tradições gastronómicas da Páscoa neste tempo de austeridade. As respostas foram, invariavelmente, idênticas a quaisquer outras que já tenham sido dadas sobre a crise e as dificuldades económicas de cada um: "Sim mas comigo não há problema..."; "Pois mas dá-se sempre o jeito e contorna-se...", Claro para os outros talvez mas eu ainda não senti...". Do conjunto de explicações que podemos encontrar para este fenómeno (selecção de entrevistados; mitomania resultante da presença de câmaras televisivas; embaraço em dar conta das suas dificuldades pessoais) há um aspecto que me parece muito interessante e que é o da não-inscrição de que fala José Gil, "em Portugal nada acontece". A não-inscrição mantém-se como resultado de uma violenta imposição social silenciosa mas omnipresente que continua a reduzir-nos a seres infantilizados porque incapazes de assumir compromissos com a realidade e sempre afirmando a inexistência de qualquer tipo  responsabilidade pessoal sobre o presente.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

"É a canalhice, estúpido!"

Há uma experiência com sapos que é muito conhecida e que me ocorre agora a propósito das declarações de Passos Coelho sobre a "reposição" dos subsídios de férias e de Natal lá para 2015 em resultado de uma suposta não definição de calendário com a troika. Ora a experiência é esta:  em laboratório reuniram-se dois grupos de sapos, o primeiro foi mergulhado num recipiente com água muito quente  em consequência, os animais reagiram de imediato e saltaram fugindo do calor, o segundo foi colocado dentro de um recipiente com água fria que foi colocado sobre fogo lento, o resultado foi que os sapos foram tentando adequar-se à temperatura que subia e acabaram por morrer cozidos. A temperatura tem subido gradualmente com uma constância muito regular e os portugueses parecem não ter percebido que ainda têm alternativa que é reagir e mudar o rumo.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Desemprego volta a disparar em Fevereiro

O Centro de Segurança Social da Madeira confirmou aquilo que já suspeitávamos, durante o mês de Fevereiro o número de desempregados na Madeira voltou a subir.Numa região em que há pelo menos 21 mil activos no desemprego, não chegam a  10 mil os que mantém o subsídio de desemprego. Se somarmos a esta realidade, a circunstância de milhares de jovens madeirenses não estarem contabilizados nesta estatística por não conseguirem reunir as condições para a atribuição da prestação ou por nunca terem chegado a entrar no mercado de trabalho, vemos engrossar, preocupantemente, uma larga faixa da população a quem está a ser negado qualquer tipo de recurso.
É neste contexto cujo o agravamento, infelizmente, se prevê enquanto as vítimas não reagirem, que entra em vigor o Programa de Ajustamento Financeiro, um compromisso imoral e criminoso dos senhores do regime com a troika para saldar as dívidas dos seus delírios de poder e ganância. Numa jogada de burlão, o PSD-M avança com a crise da sucessão e dos delfins. Siga a rusga!

Mais sacrifícios inúteis

Entrou em vigor na Madeira e no Porto Santo o Programa de Ajustamento Financeiro. Depois de mais de 30 anos de regime jardinista em que as palavras Democracia e Autonomia serviram só para engordar uma elite imoral e criminosa de parasitas que usaram como trampolim o que de melhor os madeirenses têm, a sua lealdade e brandura, qualidades que herdaram da "raça" portuguesa e que as ilhas moldaram. Quanto tempo levarão os madeirenses a perceber que lealdade e brandura podem e devem ser conjugados com os verbos honrar, vencer, dignificar? Quanto tempo mais aceitarão esta condição de servos de uma colonia que tem como raiz o medo e a desesperança?