domingo, 17 de junho de 2012

Hoje somos todos gregos


Hoje os cidadãos gregos, franceses e egípcios são convocados a eleições e escolherão pressionados entre a sua vontade de mudança e o terrorismo do discurso do poder sobre o caos. São chamados a dar voz a uma nova síntese que, no processo dialéctico que é a História, poderá representar uma nova alternativa ou, então, se continuarem a vencer os que já estão no poder, apenas o arrastar da actual conjuntura de crise até ao, muito previsível, colapso à escala global. Gregos, franceses e egípcios estão hoje entre o medo e a esperança, entre o imobilismo e a coragem, entre a resignação e a responsabilidade.
As semelhanças, infelizmente dramáticas, entre Portugal e a Grécia, devem fazer-nos espectatores atentos sobre o que está a acontecer naquele país. Lá como cá, ao longo dos anos de adesão à União Europeia, fomos recebendo fundos sob a capa das boas intenções para remediar o enorme atraso que tínhamos em relação ao resto da Europa mas o que esse caudal de dinheiro serviu, e todos o sabiam, foi para alimentar, despudoradamente, uma elite posta no poder pela questionável legitimidade democrática da abstenção. Lá como cá, os que se juntaram aos partidos que, rotativamente, estiveram e estão no poder, fizeram fortunas pessoais e dispuseram-se a cumprir as ordens das grandes empresas e da banca que não têm pátria nem moral e que por isso, se “dão nas tintas” para impostos e contributos para o crescimento económico (vivem e promovem zonas francas e paraísos fiscais). Lá como cá, todos sabiam que o sistema imporia um dia, a cobrança da dívida e lá como cá, todos sabiam que os únicos que a iriam pagar, seriam os que muito pouco ganharam. Lá como cá, a estratégia da União Europeia e os seus chefes (FMI e Banco Mundial) foi criar o monstro do buraco orçamental e do escândalo da dívida externa. Lá como cá, apareceram como “virgens ofendidas”, organizadas numa “troika” que suga a dignidade de cada português e de cada grego que vive do seu trabalho. Lá como cá, agem como terroristas que espalham o medo reprimindo pela fome e pelo sofrimento os que foram enganados tentando que não usem o seu direito inalienável de escolha de um novo rumo. Lá como cá, temos de convictamente unir forças para a mudança que tem de ser já hoje.

sábado, 9 de junho de 2012

À Camila

O JN de hoje dá conta de uma luta pela dignidade levada a cabo pelos pais da pequena Camila (aqui). Aqui fica o belíssimo poema que o pai, Carlos Sanchéz, escreveu em plena batalha pelo direito a dar à filha uma morte digna.


Camila não fala, mas diz.
Camila não olha, mas faz ver.
Camila não chora, mas faz correr lágrimas.
Camila não ri, mas valoriza a alegria.
Camila não pensa, mas ensina.
Camila não suspira, mas dá-nos alento.
Camila não ama, mas apaixona-nos.
Camila não se move, mas mobiliza.
Camila não mostra, mas nada oculta.
Camila não reclama, mas sabe resistir.
Camila não saboreia, mas é doce.
Camila não pisca, mas abre-nos os olhos.
Camila não ouve, mas escuta-nos.
Camila não trabalha, mas dignifica.
Camila não anda, mas abre caminhos.
Camila não decide, mas invoca decisões.
Camila não escreve, mas educa.
Camila não brinca, mas é uma menina.
Camila não agirá, mas comove.
Camila não cresce, mas dá corpo à esperança.
Camila não dorme, mas desperta-nos.
Camila não respira, mas purifica o ar.
Camila não ama, mas desarma corações.
Camila não condena, nas fará justiça.
Camila não come, mas alimenta almas.
Camila não grita, mas derrota a surdez.
Camila não recorda, mas tem futuro.
Camila não acusa, mas perdoa-os.
Camila não salta, mas derrubará icebergues.
Camila não procura, mas sempre nos encontra.
Camila não bebe, mas cala a sede.
Camila não reza, mas prega.
Camila não abraça, mas abrange-nos.
Camila não canta, mas é música.
Camila não cala, mas silencia.
Camila não pinta, mas tudo ilumina.
Camila não beija, mas aceita todos os beijos.
Camila não pode ser julgada, porque é um anjo.
E os anjos pertencem a Deus.

sábado, 2 de junho de 2012

Sintomas de uma cidadania gravemente doente

A entrevista publicada hoje no DN-Madeira do jovem deputado e ex-líder da JSD pode vir a tornar-se no melhor dos exemplos do que é a mais completa perversão dos valores da democracia e do exercício da cidadania. Podemos começar por dizer que há ali, pelo menos, uma enorme deformação educacional que resultará de vivências prematuras num ambiente pouco saudável mas, se isso já de si é grave do ponto de vista humano, é muitíssimo mais grave do ponto de vista do seu significado político e social porque aquele jovem integra um colectivo partidário, assumiu até há pouco a liderança de uma juventude partidária que recrutou e continua a recrutar, centenas de jovens madeirenses e vai continuar a desempenhar funções em nome daquilo que se designa na Constituição da República por "vontade popular", por isso, é muito grave quando ele se justifica em termos que têm por fundamento uma concepção de poder delegado por condição de nascimento ou por determinação "superior". Aquele deputado (provavelmente à semelhança dos que o "criaram" e rodeiam na sua bancada parlamentar) entende-se como uma criatura acima da lei, confessando julgar-se digno de uma impunidade própria dos imbecis ou dos psicopatas. É grave e inquietante.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

"Reflexaozinha"

Às vezes fico com a impressão que há assim uma espécie de dois grandes grupos em que podemos dividir os portugueses: os que esperam pelo D. Sebastião e os que se acham o D. Sebastião. Para esta "brilhante" reflexão acabo por só encontrar uma imagem para a ilustrar, a do cão neurótico que corre furiosamente atrás da sua própria cauda.